TSE NEGA PEDIDO DE LIMINAR PELO PRP DE ALCÂNTARAS
Decisão Liminar em 05/05/2011 - MS Nº 79092 Ministro HENRIQUE NEVES
DECISÃO
Cuida-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Partido Republicano Progressista (PRP) e pela Câmara Municipal de Alcântaras/CE contra a Resolução nº 439/2011, editada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE/CE), que disciplina a realização de eleições diretas no município, marcadas para o dia 5.6.2011 (fls. 2-10).
Alegam violação ao seu direito líquido e certo, tendo em vista o disposto no art. 81, § 1º, da Constituição Federal, que, segundo afirmam, determina a realização de eleições indiretas, caso as novas eleições ocorram no segundo biênio do mandato.
Sustentam que, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, os municípios têm autonomia para legislar sobre a vocação sucessória em caso de vacância de prefeito e vice-prefeito.
Afirmam que, "[...] (não legislando expressamente sobre a vacância ocorrida no segundo biênio), o Município de Alcântaras adotou, por opção (posto que não obrigatório), o modelo insculpido na CF/88: eleição indireta para eleições suplementares em decorrência de vacância no segundo biênio do mandato" (fl. 5).
Argumentam:"[...] se a Lei Orgânica exigiu eleição direta apenas para a vacância ocorrida no primeiro biênio, dessume-se que, se a vacância ocorrer no segundo, deverá ser realizada eleição indireta" (fl. 5);
Sustentam que "[...] a CF/88 utilizou como parâmetro para a eleição indireta a data da ocorrência das eleições suplementares, e não a data da vacância dos cargos" (fl. 6).
Na inicial, afirmam que "a decisão de cassação dos diplomas do Prefeito e do Vice-Prefeito Municipais de Alcântaras- CE transitou em julgado em 11/02/2011, no segundo biênio, enquanto as eleições suplementares no Município ocorrerão (por determinação do TRE/CE) em 05/06/2011, no segundo biênio do mandado 2008/2012, portanto, devendo ser indiretas" (fl. 8).
Isso porque: "se a decisão a ser executada determina que as eleições se realizem somente quando do trânsito em julgado e, referido, trânsito em julgado, como dito, deu-se em 11/02/11 - no segundo biênio - é inexorável ter que ser cumprida/executada a decisão com observância a realização de eleições indiretas, não importando a data em que se deram as vacâncias dos cargos" (fl. 8).
Ao final, os impetrantes alegam a presença: (i) do fumus boni juris, apontando a violação do direito líquido e certo da realização de eleições indiretas, nos termos do art. 81, § 1º, da Constituição Federal; e, (ii) do periculum in mora, tendo em vista a proximidade da data marcada para o novo pleito.
Com isso, requerem a concessão de medida liminar "para o fim de suspender a Resolução TRE/CE nº 439/2011 (que tratam da realização das eleições suplementares para a Chefia do Executivo Municipal de Alcântaras - CE) até julgamento de mérito do presente Mandamus" (fl. 10).
Em razão da ausência momentânea do eminente relator Ministro Marcelo Ribeiro, os autos vieram ao meu exame (RITSE, art. 16, § 5º).
É o relatório.
Decido.
Verifico, inicialmente, que o presente mandado de segurança refere-se aos mesmos fatos apresentados no Mandado de Segurança nº 70861/CE, ao qual o eminente Ministro Marcelo Ribeiro negou seguimento diante da ausência dos documentos necessários à apreciação da controvérsia, conforme decisão hoje publicada no Diário da Justiça.
Não tendo sido examinado o mérito do primeiro mandado de segurança, é, em tese, cabível a renovação da impetração, a teor do que dispõe o § 6º do art. 6º da Lei nº 12.016/2009.
Os impetrantes sustentam, em suma, que as eleições suplementares devem ocorrer de forma indireta, em razão do silêncio da norma municipal e da aplicação do art. 81, §1º, da Constituição, em razão delas estarem sendo realizadas no segundo biênio do mandato e, também, em virtude da vacância dos cargos a serem preenchidos ter ocorrido no mencionado segundo biênio.
Sobre a aplicação do art. 81,§ 1º da Constituição às eleições municipais, o Supremo Tribunal Federal já decidiu não ser necessária a reprodução simétrica desse dispositivo, que cuida das eleições presidenciais, nos dispositivos das Constituições Estaduais que tratam da hipótese extravagante de afastamento dos ocupantes dos cargos do executivo nos demais entes federativos(ADI-MC 4.298/TO, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 26.11.2009).
Do mesmo modo, ao julgar a ADI 3549/GO (Relª. Min. Cármen Lúcia, DJ 31.10.2007), o Supremo Tribunal Federal reafirmou a autonomia municipal para decidir sobre a vocação sucessória dos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito. Nesse precedente, a eminente Ministra Relatora, registrou, ao final do seu voto:
"[...] a inadequação e inaceitabilidade de se dar interpretação conforme à Constituição, requerida pela Assembléia Legislativa de Goiás, para declarar constitucional a aplicação da norma estadual impugnada enquanto não sobrevierem as regras próprias nas respectivas Leis Orgânicas Municipais. A competência outorgada constitucionalmente aos Municípios para legislar sobre assuntos de interesse local é exclusiva, afetando, na espécie, o auto-governo municipal, não comportando, portanto, a possibilidade de os Estados os substituírem enquanto eles não legislarem sobre a matéria."
É certo que tal autonomia, como bem asseverado pela eminente Ministra Cármen Lúcia, no voto proferido no Mandado de Segurança nº 186-34 não pode chegar a situações limites que afrontam o princípio democrático.
No caso, a Lei Municipal de Alcântaras, no Ceará, estabelece que:
Art. 53. Em caso de impedimento do Prefeito e do Vice-Prefeito, assumirá o Presidente da Câmara.
Art. 54. Se as vagas ocorrerem na primeira metade do mandato, far-se-á eleição direta, na forma de legislação eleitoral, cabendo aos eleitos completar o período.
Os impetrantes sustentam que, na ausência de definição na norma municipal sobre a forma como deve ocorrer a eleição quando as vagas ocorrem no segundo biênio, deveria ser aplicado o disposto no art. 81, §1º, da Constituição Federal, procedendo-se à eleição indireta.
Não verifico, neste juízo preliminar e efêmero, a presença dos requisitos necessários à concessão da medida liminar pleiteada.
Como visto anteriormente, as disposições contidas no art. 81, §1º, da Constituição Federal não tem aplicação simétrica aos Municípios.
Por outro lado, toda a tese dos impetrantes se fundamenta na premissa da vacância ter ocorrido no segundo biênio, em razão do trânsito em julgado da decisão, que cassou o mandato dos eleitos em 2008, ter ocorrido em fevereiro de 2011.
Porém, pela análise do acórdão proferido, em sede administrativa, pelo Eg. Tribunal Regional Eleitoral do Ceará, verifica-se que "a alternância da titularidade do executivo efetivou-se em 13 de agosto de 2010, consoante ofício nº [....] da lavra do Presidente, em exercício, da Câmara de Vereadores daquela Municipalidade." (fl. 22)
Vale dizer, em uma análise prefacial, o que se tem é a vacância dos cargos em 2010, ainda, portanto, no curso do primeiro biênio.
O afastamento dos eleitos em 2010 também se confirma pelas decisões tomadas nas ações cautelares 2248-81 e 2249-66. Na primeira, o Plenário deste Tribunal confirmou a decisão monocrática que negou antecipação de tutela recursal para dar efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto contra a extinção do mandado de segurança impetrado contra o ato do Juiz Eleitoral local que comunicou à Câmara de Vereadores a decisão que afastou os eleitos. A ementa do referido acórdão reafirma que ¿A cassação do diploma em sede de representação fundada no art. 30-A da Lei nº 9.504/97 tem efeito imediato, tendo em vista o disposto no art. 257 do Código Eleitoral, que estabelece a regra geral da ausência de efeito suspensivo dos recursos eleitorais" . (Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJe 19.10.2010).
Dessa primeira ação cautelar, também vale registrar o trecho da decisão monocrática, que afirmou:
"Com efeito, tendo a sentença sido mantida, em todos os seus termos, pela Corte Regional, o magistrado de primeiro grau, ao encaminhar cópia do acórdão proferido nos autos da AIJE à Câmara Municipal, informando a cassação dos referidos diplomas, nada mais fez que dar ciência ao órgão legislativo sobre a decisão tomada em primeira instância e ratificada em grau de recurso."
No mesmo sentido e no mesmo período, este Tribunal, ao examinar a Ação Cautelar nº 2249-66, negou a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento dos candidatos eleitos que foram afastados, reafirmando-se a execução imediata da decisão regional. Registre-se, ainda, que o referido agravo, interposto contra a não admissão do recurso especial que desafiava a decisão regional que julgou procedente a representação e cassou o mandato dos eleitos, foi apreciado e negado pelo Plenário desta Corte em 4.11.2010 (AgR no AI 1353-23, rel. Min. Marcelo Ribeiro).
Diante desse contexto, verifica-se que todas as decisões que levaram ao afastamento dos eleitos ocorreram no primeiro biênio do mandato, razão pela qual a decisão do Tribunal Regional que determinou a realização de eleições diretas acompanha o entendimento desta Corte assentado no MS nº 186-34/RJ, cuja ementa transcrevo:
MANDADO DE SEGURANÇA. CASSAÇÃO. PRIMEIRO BIÊNIO. PREFEITO E VICE-PREFEITO. CONVOCAÇÃO. ELEIÇÕES DIRETAS. SEGUNDO BIÊNIO. ART. 81, § 1º, CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI ORGÂNICA MUNICIPAL. VIOLAÇÃO. AUSÊNCIA. LIMINAR INDEFERIDA.
1. É lícita a convocação de eleições diretas, para fevereiro de 2011, para a complementação do mandato de prefeito e vice-prefeito, eleitos em 2008 e cassados em sede de ação de impugnação de mandato eletivo.
2. Ausência de afronta ao disposto nos arts. 81, § 1º, da CF e 87 da Lei Orgânica Municipal, uma vez que a vacância dos cargos ocorreu ainda no primeiro biênio do mandato.
[...]
(Mandado de Segurança nº 18.634, DJE de 3.3.2011, rel. Min. Marcelo Ribeiro)
Nesse sentido, também afirmou o eminente Ministro Presidente, ao apreciar o pedido de liminar no Mandado de Segurança nº 8-85/PB:
Ademais, não me impressiona, pelo menos nesta primeira análise, o argumento de que o prazo de 90 (noventa) dias foi descumprido pela Corte Regional, simplesmente porque, para fins de se verificar a espécie de eleição (direta ou indireta), o que importa não é o momento em que a eleição efetivamente ocorrerá, mas o momento em que aconteceu a vacância (primeiro ou segundo biênio) e a consequência jurídica imposta pela legislação municipal.
A propósito, o Tribunal Superior Eleitoral, analisando situação semelhante, assentou que, ocorrendo a vacância no primeiro biênio do mandato eletivo, a eleição deve ser realizada de forma direta, mesmo que já esteja em curso a segunda metade do mandato eletivo. Transcrevo trechos dos votos dos Ministros Ari Pargendler e Cezar Peluso, respectivamente:
"Senhor Presidente, por meio deste mandado de segurança, a Câmara Municipal de Aliança ataca a Resolução nº 93, de 20 de agosto de 2007, do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, que aprovou instrução para a realização de novas eleições diretas naquele Município já decorridos dois anos dos mandatos findos pela renúncia dos titulares (fl. 02/12 e 16/30).
(...)
Senhor Presidente, a norma do art. 81, § 1º, da Constituição Federal foi adotada pela Lei Orgânica do Município de Aliança, PE. Não obstante isso, a meu juízo, se a sentença que cassou o mandato foi proferida no primeiro biênio deste, nada importa que os recursos dela interpostos tenham sido julgados no biênio seguinte; prevalece a data da sentença, porque - na lição de Chiovenda - esta `deve reportar-se ao estado de fato existente ao tempo da demanda¿ (Instituições de Direito Processual Civil, Edição Saraiva, São Paulo, 1965, vol. I, p. 163).
(...)" (MS 3.634/PE).
"2. Peço vênia para discordar do voto do Ministro Relator, mas concordar com o seu ponto de vista acerca dos efeitos retroativos da perda dos mandatos à data da sentença, ainda que, em juízo sumário, tenha votado favorável ao agravo regimental que concedeu a liminar.
De fato, tomando-se por base a sentença do juízo singular, a dupla vacância ocorreu no primeiro biênio, o que, por si só, implicaria realização de eleição direta, porque os recursos eleitorais não gozam de efeito suspensivo.
(...)" (MS 3.634/PE).
Portanto, no presente feito ora em análise, tendo ocorrido a vacância no primeiro biênio, verifico que a resolução do TRE/PB, ao estabelecer a realização de eleições diretas no Município de Itapororoca/PB, além de cumprir exatamente o que determina a Lei Orgânica daquele município, deu efetividade à soberania popular, exercida pelo voto direto e secreto (art. 14 da Constituição Federal de 1988).
Assim, no que pese a existência de decisões monocráticas que indicam a necessidade de realização de eleições indiretas a partir do início do segundo biênio dos mandatos, considero que no exame da presença do requisito da fumaça do bom direito devem ser consideradas as decisões proferidas pelo Plenário deste Tribunal. Isso, logicamente, sem prejuízo de posterior reexame e eventual reposicionamento do órgão máximo da Corte.
Por fim, sobre o requisito do periculum in mora, noto que as eleições estão designadas para 5 de junho do corrente ano, o que revela tempo suficiente para que a questão seja reexaminada pelo eminente relator do feito e, se for o caso, pelo Plenário desta Corte. Destaco, ainda, que como afirmado pelo eminente Ministro Arnaldo Versiani, ao apreciar a liminar no MS nº 759-72: ¿tendo em vista que o calendário já está em curso [...] a sustação do processo eleitoral, nesse momento, implicaria tumulto, considerando o curso do terceiro ano do respectivo mandato eletivo e a necessidade de eventual designação de nova data para o pleito" .
Assim, sem prejuízo de uma melhor análise pelo eminente relator do feito, indefiro a liminar pleiteada.
Solicitem-se informações.
Publique-se.
Brasília-DF, 5 de maio de 2011.
Ministro Henrique Neves da Silva(RITSE, art. 16, § 5º)